Agressões na rede inibem conteúdo autoral
Apenas 34% dos jovens de Salvador que se interessam por política têm produzido conteúdo autoral para internet

Apenas 34% dos jovens da capital baiana que se interessam por política têm produzido conteúdo autoral para postar na internet, seja texto, vídeo, podcast, meme etc. A maioria deles prefere interagir com o que já está circulando na rede. É o que mostra nossa pesquisa “Pelo celular e pelas ruas de Salvador: participação política de jovens e a relação com as competências infocomunicacionais”.
Entrevistamos 280 jovens de Salvador, com idade entre 18 e 29 anos, que garantiram ter a política como tema de interesse. O comportamento de nossos entrevistados é próximo da média apresentada pela população brasileira conectada: somente 31% dos usuários de internet no país publicam conteúdos próprios, segundo a TIC Domicílios 2021.
Esse percentual era de 39% em 2018 (TIC Domicílios 2019), ou seja, vem sofrendo queda nos últimos anos em que se nota aumento da polarização e dos discursos de ódio nos ambientes digitais.
Nossa pesquisa investigou ainda como se deu entre os jovens o compartilhamento de conteúdos com teor político nos episódios eleitorais de 2018 e de 2020. Os dados evidenciam resultados parecidos com os mencionados no início do texto: cerca de 30% dos entrevistados criaram e publicaram informações sobre política na internet nas eleições de 2020 para prefeito, e outros 36% nas eleições para presidente em 2018.
A atitude dos jovens de compartilhar na rede é mais intensa quando o conteúdo político é produzido por terceiros: 51% dizem ter realizado essa ação em 2020, enquanto nas eleições presidenciais de 2018, o percentual de jovens com esse comportamento foi ainda maior: 64%. Ou seja, apesar da forte presença on-line, as juventudes são tímidas em relação à produção e compartilhamento de conteúdo autoral.
A inquietação diante desses resultados nos motivou a realizar entrevistas em profundidade com os jovens para entender as razões que os levam a postar pouco conteúdo que produzem. Uma das participantes explicou: “agora mesmo acabei de desinstalar todas as minhas redes sociais e só estou com WhatsApp por conta da toxidade das redes sociais. [...] você bota uma opinião, vem gente discordando de uma forma bem agressiva, não é aberto a um debate, é agressão e pronto”.
Outro jovem complementa: “Tenho medo [...] porque, se você coloca de uma maneira errada, a internet hoje em dia tem essa mania de cancelar, entendeu? Esse
cancelamento é doloroso”. O receio de sofrer ataques está sempre presente nas justificativas dos jovens que se sentem retraídos na internet. A questão é o quanto estamos escutando as juventudes sobre essas mudanças de comportamento e como construirmos, juntos, ambientes mais saudáveis e responsáveis.
A pesquisa na íntegra está disponível aqui.
*Daniela Silva é doutora em comunicação e cultura contemporâneas, pesquisadora, educadora e jornalista.