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Como se elege um sucessor nas democracias?

Publicado segunda-feira, 14 de março de 2022 às 06:00 h | Autor: Cláudio André de Souza*
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"O mundo da política não leva ao céu, mas sua ausência é o pior dos infernos": como não concordar com Maquiavel? A invenção da política permite à humanidade a criação de instituições que selam o nosso destino, em direção ao autogoverno. O que Maquiavel quis dizer, em resumo, é que o poder político possui uma origem mundana.

Não existe um “manual prático” e definitivo de estratégias políticas, por si só capaz de guiar indivíduos no processo de adquirir poder. Trata-se quase sempre de um complexo arranjo de fatores que se justapõem de maneira conformada no terreno político, em torno das instituições.

O tempo político exige que se preparem lideranças que sejam aceitas e legitimadas dentro de um processo gradual de representação política. A projeção de lideranças se entrecruza com a ocupação de espaços nas instituições (parlamentos, partidos e governos) e na sociedade civil. Nas últimas semanas, virou uma novela a crise da base governista para formatar a chapa de sucessão ao governador Rui Costa (PT). Jaques Wagner (PT) e Otto Alencar (PSD) desistiram da tarefa, evidenciando o equívoco do grupo em não ter planejado previamente a sucessão ao governo baiano.

Em 2008, mesmo sem expectativa de vitória, ACM Neto sabia que sua missão era ser candidato a prefeito para consolidar sua liderança interna no que restou do carlismo. A mesma estratégia já tinha sido usada por Jaques Wagner em 2002, quando foi candidato ao governo contra Paulo Souto, na difícil tarefa de formar um palanque anti-carlista para Lula.

Vale lembrar que o ACM avô trouxe o próprio Souto para sua chapa nas eleições de 1990, na condição de vice-governador, fazendo dele seu sucessor nas eleições seguintes, de 1994. ACM Neto usou da mesma estratégia ao apresentar Bruno Reis como seu vice-prefeito e, posteriormente, seu sucessor na prefeitura. Em novembro de 2008, numa entrevista ao jornalista Fernando Morais, Lula falou pela primeira vez que a então ministra Dilma Rousseff seria candidata a sua sucessão nas eleições de 2010. Wagner já tinha em mente que Rui seria seu sucessor muito antes de março de 2014, quando anunciou a sua escolha. A essa altura, o atual governador já tinha se tornado a principal liderança petista no governo.

A escolha tardia de Jerônimo Rodrigues para ser o nome do PT na disputa pelo governo sinaliza que o partido viverá, nos próximos anos, uma longa travessia para renovar lideranças -- e deixa flagrante que não houve um curso normal na construção política da sucessão ao governo atual. O tempo e as urnas farão o balanço sobre os erros do PT, bem como se haverá condições para os petistas repararem os prejuízos. Fazer um sucessor requer tempo e liderança interna no grupo. Nesse quesito, Jerônimo terá muito trabalho pela frente.

*Cláudio André é Professor Adjunto de Ciência Política da Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira (UNILAB) e um dos organizadores do “Dicionário das Eleições” (Juruá, 2020). E-mail: claudioandre@unilab.edu.br

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