A governabilidade de Lula
Cenário político impõe que o governo busque negociar no “varejo” com parlamentares e líderes partidários

O estado de tensão observado em Brasília na última semana não foi para menos. Se na Câmara dos Deputados a reeleição do deputado Arthur Lira (PP-AL) com 464 dos 513 votos à presidência da Casa transcorreu sob um “céu azul”, o clima tempestuoso da eleição no Senado fez redobrar com urgência as articulações políticas governistas na partilha de cargos e verbas de emenda para agraciar uma parte dos senadores indecisos no apoio à reeleição de Rodrigo Pacheco (PSD-MG), que venceu a eleição com 49 votos a favor.
Logo após a abertura das urnas em outubro do ano passado, já sabíamos que a base bolsonarista saiu mais forte ao constituir uma bancada para a legislatura atual (2023-2027) com trânsito entre os 13 senadores filiados ao Partido Liberal (PL), 11 parlamentares do União Brasil, 6 pelo Podemos, 7 senadores do PP e 3 parlamentares do Republicanos.
Este desenho eleitoral da ala bolsonarista no Senado coincide com os 32 votos a favor de Rogério Marinho (PL-RN) na votação da quarta-feira (1º). Se publicamente o ex-ministro de Bolsonaro partiu para um tom mais moderado de defesa das instituições, por trás dos holofotes coadunou com críticas de colegas ao STF, inflando a narrativa golpista do seu ex-chefe aventada antes e depois da derrota eleitoral sofrida para Lula (PT).
A força do bolsonarismo na arena parlamentar não é uma surpresa, pois, compõe o cálculo político previamente feito em torno da formação da base aliada de Lula no Congresso. A articulação de Marinho entre os senadores foi suficiente para também angariar votos dentro dos partidos que oficialmente estavam do lado de Pacheco. Às vésperas do pleito, três senadores do partido do presidente do Senado, o PSD, afirmaram que votariam em Marinho.
O baralhamento das forças político-partidárias, isto é, o quanto os partidos precisarão se “desbolsonarizar” em uma travessia de retorno ao jogo do poder democrático, mostra que a legislatura atual não ficará restrita ao debate ideológico, já que o fantasma do golpismo rondará o ambiente político, mas de forma residual.
Como fica a governabilidade de Lula? A adesão do governo às candidaturas de Lira na Câmara e de Pacheco no Senado foi um sinal muito claro de que não havia correlação para impor-se uma alternativa política em ambos os pleitos. Neste momento, o governo tem 228 deputados na base do governo na Câmara e 42 senadores.
Sem dúvidas, o cenário político impõe que o governo busque negociar no “varejo” com parlamentares e líderes partidários em torno de interesses comuns, em especial, entre quem resiste em aderir ao governo. A agenda política de Lula vai marchar nesta direção, mas dependerá muito mais do apoio das ruas e do efeito positivo de políticas públicas na popularidade e aprovação do seu governo.